Um dedo de prosa

Germana Telles

Por que? 11:58

É engraçado como a gente vai mudando os conceitos, à medida que o tempo passa. Temos fases, como a lua (como diria a Cecília), e tudo começa na idade do por que (?).


Acabo de constatar isso, conversando com amiga, que está na fase do “mais ou menos”, “sei lá” e “pode ser”. Fase chata, já adianto, para aqueles que certamente também deverão experimentá-la.

No por que, tudo é novidade. A gente está como brinquedo novo, que acabou de sair da caixa, olhando tudo em volta com olhos de descobridor. Por isso, não nos aguentamos em meio a tantos rostos desconhecidos, tantos lugares novos, tanto mistério. Desandamos a mandar por ques pra tudo quanto é lado, irritamos pais, tios e irmãos, mas vale a pena.

É por uma boa causa que vivemos as interrogações: para que possamos começar a experimentar a vida. Bom lembrar: nunca devemos nos esquivar dos por ques dos pequenos. Nada de dizer “porque sim”, “porque não”, “porque é assim e pronto”, quando surgirem aquelas perguntinhas básicas: “Mãe, por que a Terra gira e eu não fico tonto?” ou “Por que eu não posso pular da janela?” ou ainda “Por que aquela criança mora na rua e eu tenho um quarto só pra mim?”.

Os por ques sempre têm um porquê. Merecem ser respondidos, devem ser respondidos, com clareza e verdade, para que os pequenos tenham a visão certa das coisas, criem valores, abram seus olhos e seu coração para o mundo, para o outro, para o semelhante e o desigual.

Muitos desses por ques também servem para nos dar um belo “sacode”. É chato ter que olhar o óbvio em nossa frente, ver face a face nossos erros, nossas fraquezas, nossa falta de sensibilidade gritando à nossa frente, batendo em nosso estômago como um soco, após um “por que?” lançado por uma criança.

Adoro a fase do “por que?”, que já me chegou quatro vezes, através de quatro menininhas minhas e lindas. Mesmo quando fiquei muito irritada, tendo que controlar a metralhadora mandando por que, por que, por que, numa velocidade impressionante, e eu me vendo louca, tendo que buscar a resposta mais clara possível para o que não costumamos nos preocupar em explicar.

Mas a fase do “mais ou menos”, “sei lá” e “pode ser” é insuportável. Credo. Ou uma coisa é ou não é. Ou é boa ou é ruim. Ou é feia ou bonita. Ou é claro ou é escuro, frio ou quente, alegre ou triste. Não é mesmo?

Ou alguém quer ou não quer uma coisa. Ou vai ou não vai. Ou serve ou não. Sei lá o escambal. Sei lá...

Pior ainda é quando vem o “pode ser”, que na verdade quer dizer “não pode ser, não dá, não quero, mas vou te cozinhar mais um pouquinho”. Pode ser é o pior, mesmo.

Por isso, vou lançar mão da sabedoria infantil agora, sempre que me jogarem um mais ou menos, pode ser ou sei lá. Criatura terá como troco um belo “por que” e não vale mentir de volta, eu já conheço bem o truque.